domingo, 28 de fevereiro de 2010

ANA COELHO

Bom para mim é uma experiéncia marcante, essa entrevista será também minha estreia.
É uma entrevista em aberto para que possamos conhecer melhor Ana Coelho, os
colegas do Sei Lá poderam interagir postando suas perguntas.


1 - Quem é Ana Coelho poeta?

Ana Coelho é uma mulher vulgar que todos os dias sai para trabalhar veste uma farda e tem uma família para cuidar, como tantas outras mulheres nesta idade.
A escrita é algo que está em mim com a mesma naturalidade com que faço todo o meu quotidiano. Não consigo pensar que sou poeta, ser poeta é ser algo mais do que aquilo que vejo em mim.
Contudo a poesia que faço é algo que saí em qualquer momento do dia, são pensamentos que se soltam em palavras. A inspiração vem dos sentimentos, alguns meus outros de alguém que os partilha comigo, outras vezes é a observar um objecto uma imagem ou somente do ”vazio”.

2 - Quem é Ana Coelho como ser humano, como voce se vê?

A auto analise é algo que não é nada fácil de fazer.
Sou muito daquilo que escrevo, serena, tranquila, pacificadora. A amizade é algo que dou imenso valor, a confiança algo intocável, nunca trai e jamais faço intriga (pelo contrario). Já fui acusada e em silêncio faço a minha defesa que o tempo acaba por mostrar. “ a luz encaminha sempre o brilho ao que está encoberto e nunca o inocente será eternamente condenado”.
Gosto de olhar sempre o lado positivo das coisas e tirar das realidades as lições que todas elas nos ensinam.
Gosto de sorrir com o olhar.
E tenho por princípio de vida dar sem esperar receber.
Não gosto da “ribalta” , vivo a simplicidade das coisas e nelas encontro um mundo esplêndido onde me sinto realizada.
No meu coração não cabem sentimentos negativos e não consigo desejar mal a ninguém.
Defeitos também devo ter…rsrsrs, mais difícil definir…(a pensar…a pensar…) não encontro, terás de perguntar aos meus amigos…rsrsrsrsrs

3 - O que acha que a influenciou ?

A leitura dos contemporâneos desde os tempos de infância pode ser a grande marca no que escrevo.
Mas a influência mais marcante é aquela que tenho mesmo aqui ao meu lado, talvez não seja, bem influência mas sim o incentivo a compreensão e a forma de partilha que temos na cumplicidade de uma vida traçada pelos mesmo princípios, gostos e formas de estar perante a filosofia da escrita e do destino.

4 - Ana quanto à poesia já pegou o gosto de não querer largar?

Quando a poesia saí da alma podemos até deixar um dia de a mostrar ao mundo mas nunca deixamos de o fazer, faz parte do ciclo de libertação dos sentimentos das emoções e do prazer que escrever nos dá gratuitamente.

5 - O que vem a ser um poeta para voce?

Aqui a minha resposta vai ser na voz de Flor Bela Espanca uma poetiza que desde cedo li e ainda hoje releio com todo o prazer de uma primeira vez.
Ser Poeta

Ser poeta é ser mais alto, é ser maior
Do que os homens! Morder como quem beija!
É ser mendigo e dar como quem seja
Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!
É ter de mil desejos o esplendos
E não saber sequer que se deseja!
É ter cá dentro um astro que flameja,
É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito!
Por elmo, as manhãs de oiro e cetim…
É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente…
É seres alma e sangue e vida em mim
E dizê-lo cantando a toda a gente!

(Florbela Espanca, «Charneca em Flor», in «Poesia Completa»)

Esta é a mais sublime descrição do poeta que Luís Represas deu voz musical um marco também na música.

6 - Quais foram os grandes inventores da poesia portuguesa do passado?

Foram todos aqueles que ousaram escrever contra preconceitos , ditaduras e atravessam séculos até aos dias de hoje, grande parte deles nunca foram compreendidos enquanto vivos.

7 - Num mundo globalizado onde tem espaço para Reality show, qual o lugar da poesia?

Apesar de cada vez encontrar mais pessoas que gostam de poesia, sinto que nos média ela anda muito esquecida.
Os Reality show vivem de sensacionalismos onde a poesia não tem muito lugar. Infelizmente

8 - É romántica? Chora ao escrever? Já escreveu com raiva?

Sim sou muito romântica, não fosse eu casada com um poeta rsrsrsrs…adoro todos os gestos que o romantismo traz com emoção e que tantas vezes é encarada pelo “mundo” como em desuso. Uma flor num dia em que nada se festeja, os beijos trocados sempre a qualquer tempo, um carinho na mão, todas as lamechices dos eternos apaixonados. A troca de olhares que me faz corar ( vindos do meu amor rsrsrsr), os poemas trocados em papeis escondidos num bolso.
Sim já chorei a escrever, também não é necessário muito para chorar, sou muito chorona, caem lágrimas com a mesma facilidade com que se rasga um sorriso nos lábios.
A raiva é um sentimento que desconheço, já escrevi com dor magoa nostalgia, a raiva é um sentimento que contamina quem a sente, é um veneno letal a quem o manuseia em leviandade.

9 - Qual de suas poesias lhe proporcionou mais prazer? Qual lhe ensinou mais?

Todos os poemas me dão prazer, é um acto de amor em que o prazer nunca pode ficar de fora porque se ele não existir é um acto fútil e banal, em cada poema tenho um pedaço de mim dado com toda a minha capacidade e sensibilidade não me sendo possível distinguir. Contudo quando faço dedicatórias aos meus filhos sinto um prazer mais forte pela profundidade que o amor maternal nos faz sentir.

10 - Como vê a integração em comentários em poemas?

Os comentários são uma forma de interagir entre pessoas que têm o mesmo gosto.
O contexto em que são feitos por algumas pessoas é que por vezes me faz discordar. Não podendo fazer comentário com profundeza literária porque a grande maioria não possui habilitações para tal, mas devem ter sempre a ver com o que se acaba de ler e não colocar situações pessoais nos mesmos.
Os comentários de correcção também devem ser feitos e aceites pois são uma forma de crescimento nos espaços de partilha, desde que feitos de forma educada e com coerência.

11 - Voce lê muito? Qual seu autor preferido? Em poesia voce tem algum autor preferido?

A leitura faz parte de mim desde que aprendi a ler, é algo que tenho sempre que fazer.
Trago comigo sempre um livro e nos momentos “mortos” do dia vou lendo, ao deitar é algo obrigatório (algumas vezes leio uma só frase e adormeço rsrsrsr mas se não pegar no livro o sono não chega rsrsrsr)
Os que mais admiro, são muitos ou quase todos mas arisco dar uns nomes:
Adorei estudar e ler Camões, Fernando Pessoa, Cecília Meireles, Flor Bela Espanca, Mia Couto e uma escritora angolana que tento acompanhar Ana Paula Tavares.
E muitos dos que hoje escrevem que também já são referências e talentos em revelação constante, com a vantagem de a alguns conhecer o olhar.

12 - Quais teus projetos para o futuro, já tem algo em mente?

Nunca projecto o futuro ele acontece com naturalidade.
Tudo o que até hoje fiz aconteceu simplesmente com naturalidade, são segmentos contínuos sem grande programações mas tudo que faço coloco amor em todas as formas em primeiro lugar e sigo os impulsos da alma em liberdade sem ambição.

Ana Coelho


De:

José Luís Lopes

Parabéns Vânia por esta primeira grande entrevista, foste maravilhosa.

E como estas entrevistas são dinâmicas, todos nós podemos valorizar ainda mais o “trabalho” da nossa amiga Vânia, aqui fica mais uma pergunta para a Ana:

Como encaras as novas amizades que o mundo das palavras escritas acabou por formar na tua “nova” vida de escritora.
Termino deixando-te um grande beijo pela beleza das tuas respostas às perguntas colocadas pela nossa Amiga.

Ana Coelho:

A vida de escritora” é para mim um hobby ao qual não gosto muito da palavra escritora, porque o que sinto em mim é a necessidade de escrever e não tenho qualquer habilitação para tal.
No universo da partilha em que me encontro e encontro variadas pessoas com o mesmo gosto e prazer pelas palavras, é um mundo igual ao mundo onde nos movemos, como tal encontramos variadas personalidades e formas de estar e pensar.
E como este universo ao qual falo é um espaço de internet, no inicio em que comecei por estar, observar e mais tarde comecei por partilhar a minha escrita, estava muito longe de imaginar encontrar verdadeiros amigos.
Contudo a envolvência é de tal forma intensa que no decorrer deste tempo, já me foi possível viver tantas emoções…
Existem pessoas que mesmo antes de as olhar nos olhos já sentia e sinto verdadeira amizade.
O processo é o mesmo com o qual nos deparamos no quotidiano, por exemplo no nosso ambiente de trabalho passam várias pessoas e só com algumas criamos laços efectivos de amizade.
Já me desiludi também, com tanta força como aquela que fiz verdadeiros alicerces de companheirismo, porque em cada forma existe uma personalidade que se enquadra ou não com a minha forma de estar e viver a vida, essas passam para planos aos quais não dou importância.
No paralelo o inverso é a verdade da forma como tenho recebido carinho e incentivos por parte dos meus novos amigos, que para mim são como amigos de sempre e que jamais os esquecerei mesmo que os percursos se desviem.
Estes verdadeiros e bons amigos são todos aqueles que estão neste espaço e mais alguns, (não muitos) de outros espaços por onde as palavras se cruzam e os sorrisos mesmo por detrás do ecrã se encontram na pura forma dos sentimentos vividos com muita veemência e realidade.

São Gonçalves:

Sendo tu uma poetisa que explora muito bem os temas ligados ao romantismo, quais são os outros temas que mais te inspiram?

Ana Coelho:

De facto a temática do amor é uma das que mais gosto até mesmo como leitora.
A inspiração é algo que surge em várias vertentes a outra temática, é a vida o destino e as acções que cada um tem para com ela.
E como já disse anteriormente muitas vezes as palavras saem em emoções que sinto em conversas ou em observações do quotidiano.
A escrita é algo que não consigo fazer por obrigação mas sempre em actos espontâneos.
Algumas vezes escrevo nos desafios, por imagens ao por temas gosto de responder a estes exercícios.

JOÃO VILLARET: VOZ DOS POETAS

João Villaret deixou-nos subitamente, ainda Alice não era gente. Pelo avô deliciou-se com o público que enchia os teatros para ouvir aquele homem grande, grande cuja voz ecoava ora declamando, ora sussurrando poemas de grandes autores pois que fora dotado de uma voz e um talento que capturava multidões.

Fora com minha mãe,já o artista tinha morrido, ao cinema São Jorge, à hora do almoço, a umas sessões (custavam vinte e cinco tostões, se não me falha a memória)de evocação de João villaret, impensáveis nestes tempos de hoje: um palco enorme, uma cadeira vazia, um holofote sobre essa mesma cadeira e uma magnífico, para a época, som, gentilmente cedido pela Philips. Só...e a sua voz gravada em vinil, na maior parte dos seus espectáculos no São Luiz. Quarenta minutos mágicos, fruidos em profundo silêncio naquela plateia imensa do São Jorge. Quanta emoção, quanta saudade daquele "Menino da sua Mãe" de Fernando Pessoa e tantos outros poemas que eu aprendi a amar depois de o ouvir. Precocemente, a 21 de Janeiro de um ano já longínquo, deixou-nos.Fica aqui este modesto testemunho.


arlindo mota

João Villaret - Procissão

Lançamento Do livro: NUANCES DE UM SILÊNCIO A DOIS



A partilha de um dia especial

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Verticalidades


Há esperas, que nada mais são, do que fugas permanentes entre o querer e o ser, na veracidade das palavras. Serão elas um meio para atingir certos fins, sempre que vierem carregadas de imagens que transcendam a nossa postura erecta. Contudo, há na verticalidade dos nossos gestos, uma figura abstracta, e será sempre ela que nos dará um certo estilo para a composição métrica de um bom tema, em perfeita comunhão com o sentimento que se sobrepõe à razão da nossa própria existência. Que o preenchimento dos espaços em branco não deixe margens para dúvidas, pelo que nas margens também se escreve, e muitas vezes por temor aos cursos dos rios, que silenciosamente, passam sem retorno, virando costas e fomentando a postura horizontal, mais apetecível às correntes baças e taciturnas.

Há nas palavras escritas, um toque especial que nos toca fundo, e há vozes premeditadas em que o som, é uma nota solta à espera do tempo certo. Será mesmo esse o que me desperta para um encontro, onde o tempo colide com a espera e nada mais fará prever, que há um tempo certo para cada encontro. Numa dimensão mais cuidada, onde somos à transparência, um só corpo, que se movimenta num espaço aberto, há também um ponto minúsculo que separa, as pontas de um espaço fechado. Aí, teremos as mesmas distâncias coordenadas por uma única aberta no tempo. Trancam-se as vozes perdidas, movimentam-se as sombras que abraçaram em tempos palavras ocas – vácuo onde existia a formação do ser na forma original. Paradigma da inteligência criativa e sonora numa escala deveras inquietante, que me faz partir para lugares incertos. Será sempre essa espera, o preenchimento de pontos vazios num espaço cuidado e assertivo para que as mensagens não falhem, permitindo que não se espalhem como grãos de areia num deserto feito de esperas.

Os nossos tempos são unos nas distâncias que nos separam. Os seus propósitos caminharão ao lado de algum sentimento, virão a seu tempo e nos dirão de nós num tempo sem tempo, mas com todos eles alinhados e depositados num único olhar. Caminho contigo em busca de outras eras, que nos transformem, que nos digam de nós num movimento constante, por onde se soltem partículas de um sonho prestes a acontecer. Será ele, a fuga que pretendemos, quando nos comunicarmos em silêncio e nele nos encontrarmos uns e outros, mas todos UM.
*******************************************
Texto dedicado a um poeta e amigo, José Luis Lopes acerca do seu poema "O Grito"
http://www.worldartfriends.com/modules/publisher/article.php?storyid=18980