domingo, 7 de março de 2010

A minha luta.

Perguntamo-nos muitas vezes porque nascemos em famílias com determinadas características e não numa outra qualquer.
Se as nossas famílias têm um papel fundamental no nosso percurso, disso não tenho muitas dúvidas.
Nasci no seio de uma família onde a mulher não tinha nenhum valor, cresci a vê-las ser maltratadas no seu corpo e na sua dignidade. Nunca me habituei a esta forma de ver a mulher, e sempre soube desde muito nova que não era isto que queria para mim e haveria de lutar sempre contra este espírito de posse masculino.
As mulheres da minha família, principalmente a família paterna, eram mulheres infelizes, trabalhavam a terra, enquanto carregavam no ventre gravidezes sucessivas, nunca paravam a seguir aos partos, não tinham voz activa nas decisões importantes e algumas delas eram espancadas. Felizmente a minha mãe nunca foi espancada, mas era uma escrava da casa, do marido e sem vontade própria
Sempre me revoltei com estes atentados a dignidade humana.

Aos 10 anos o meu pai com a sua prepotência e ignorância impedia-me de seguir os estudos, mesmo a pedido de algumas pessoas professores da escola primária, para as mulheres não tinham que estudar, tinham que trabalhar.

Tive assim o meu primeiro desgosto e a revolta de sentir os meus sonhos esvoaçarem para o futuro.
Aos 18 anos deixo a aldeia em que nasci, a família, pessoas que amava e enfrento sozinha e sem a bênção de ninguém a vida na grande cidade de Lisboa. Impedida de voltar a entrar na casa dos meus paus, criticada por toda uma comunidade, era preciso encarar a vida de frente e lutar, avançar e mostrar a todos que eu tinha tudo nas mãos para não ser aquilo que todos tinham premeditado, que eu seria mais uma desgraçada na grande cidade.

Fui empregada domestica, estudei de noite, e fiz a escola secundaria em 5 anos. E lutei para me manter uma mulher digna.
Foi nesta luta e no gosto pela escrita que hoje ando a procura palavras para falar da luta destas mulheres cujo silêncio lhes foi imposto durante toda uma vida.

Luto todos os dias para mostrar que somos mulheres. mas também somos seres humanos, com desejos, vontades e sonhos. Que merecemos respeito da parte dos homens,maridos,filhos ou amigos.

Deparo-me agora com uma outra realidade que me incomoda e que tento combater todos os dias.
a incompreensão por parte das outras mulheres pela liberdade com que conduzo a minha vida.

Ou seja, para ter tempo para ler, escrever, ter o meu próprio espaço, tenho um marido que partilha as tarefas diárias e tenho ajuda na manutenção da casa.
Mas as mulheres foram educadas a serem elas a tratarem da casa, dos filhos, como se isso fosse
uma obrigação.
Hei-de sempre lutar contra este preconceito venha ele da parte dos homens, ou da parte das mulheres.

Porque dia da mulher, é todo o dia do ano, porque temos capacidade de sermos respeitadas e amadas nas nossas qualidades e nos nossos defeitos,nos nossos sonhos e nas nossas aspirações.

São Gonçalves

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